segunda-feira, 27 de dezembro de 2010

A moradia do pobre ameaçada pela Copa


A moradia do pobre ameaçada pela Copa e pelas Olimpíadas – 10 de outubro de 2010
Relatora da ONU para o direito à moradia adequada afirma que somente com mobilização é possível frear despejos              6/10/2010

Eduardo Sales de Lima
da Redação
A realização de grandes eventos esportivos vem sempre acompanhada por violações aos direitos humanos. Especificamente no setor de moradia, os problemas sobressaltam-se ainda mais. Isso é o que conclui a relatora especial da Organização das Nações Unidas (ONU) para o direito à moradia adequada, Raquel Rolnik.
Para ela, as comunidades mais atingidas e desrespeitadas por grandes eventos esportivos são justamente as de menor renda. A relatora da ONU cita exemplos de remoção em massa no Cazaquistão, na Índia e na China, por conta de eventos desse tipo.

Rolnik destaca que, por meio de mobilização popular, ainda é possível evitar os despejos autoritários tão comuns no Brasil. E isso já está ocorrendo. Organizações sociais urbanas de todo o país realizaram, entre os dias 20 e 24 de setembro, a Jornada de Lutas Nacional contra Despejos.

Potencializadas, agora, pela realização da Copa do Mundo e das Olimpíadas, em 2014 e 2016, respectivamente, as remoções massivas de comunidades pobres, em decorrência de obras de infraestrutura, tendem a se intensificar. Em entrevista, Rolnik elucida essa e outras questões.

Brasil de Fato – Trata-se de um mito o fato de que a realização de grandes eventos valorizam as cidades-sede e melhoram os indicadores socioeconômicos?
Raquel Rolnik –
A pergunta central que deve ser feita é “benefício para quem?”. Esses grandes eventos esportivos geram oportunidades de negócios. Isso implica uma movimentação do ponto de vista dos negócios, da dinamização econômica dessas cidades. Agora, toda a discussão é quem será beneficiado por isso. E a resposta vai depender fundamentalmente do conjunto de políticas que serão implementadas por essas cidades e, nos eventos de jogos olímpicos, no Rio de Janeiro. Vamos depender muito da capacidade de organização da sociedade civil. Um exemplo é o caso da cidade de Vancouver, no Canadá, sede dos Jogos Olímpicos de Inverno, ocorridos em fevereiro de 2010, que tinha uma proposta inicial e que teve toda uma mobilização social que obrigou os promotores do evento a reverem seus planos e suas posições e incorporarem uma agenda muito mais social a partir dessas intervenções.

Você destaca em sua relatoria da Organização das Nações Unidas (ONU) que um dos setores que serão mais atingidos será o da moradia. Mas os projetos urbanísticos relacionados às cidades-sede da Copa do Mundo no Brasil poderão sofrer mudanças com mobilização social, sobretudo os relacionados à moradia?

Isso é uma questão constante nas cidades que sediaram eventos desse tipo. A remoção em massa, decorrente das grandes obras, não somente da construção ou reforma de estádios, mas também das obras de infra-estrutura em conjunto, promovendo reurbanização e melhorias na mobilização das cidades, atinge especialmente as comunidades de mais baixa renda e os assentamentos informais. Eles são muito vulneráveis às situações de remoção na medida em que a situação da propriedade é muito menos reconhecida no âmbito jurídico do que a propriedade privada registrada no cartório.

Ou seja, quando as obras de infraestrutura ligadas aos estádios envolvem propriedades privadas, vão envolver compensação, vão envolver um pagamento em relação àquela casa e muitas vezes o pagamento é razoável. O que acontece é que quando se trata de comunidade de baixa renda, normalmente, os direitos são muito pouco reconhecidos, mesmo o direito à moradia estando escrito na Constituição, como no caso brasileiro.

Nós já estamos assistindo às propostas de remoção em Belo Horizonte (MG), em Fortaleza (CE), no Rio de Janeiro (RJ), em São Paulo (SP). Em várias cidades do Brasil isso já está acontecendo sem a adequada compensação com propostas de assentamento. Até o momento isso é um dos grandes problemas, dos grandes perigos na realização desses eventos aqui no Brasil, violações no campo do direito à moradia.

Você sabe quantidade de famílias que já foram ou serão atingidas?

Eu estou tentando montar uma base de dados. Mas não há informação, é uma caixa preta. Como é possível que projetos que estão sendo apresentados para acontecerem por cima de comunidades sequer disponibilizam a informação de quantas famílias vão ser afetadas, e qual será o destino dessas famílias. Essa informação não existe, ela não está disponível.

O que eu sei, inicialmente, é que, no Rio de Janeiro, sessenta comunidades seriam de alguma forma atingidas por obras ligadas à Copa do Mundo a às Olimpíadas. Isso pode ser parcialmente, pode ser totalmente. Mas quantas pessoas estão nessas comunidades, qual o tamanho delas, o que irá acontecer, nada disso se sabe, não se tem dados. E isso é o elemento básico na questão do direito à moradia, que é o direito de todos os atingidos de saber quando tal projeto fica pronto, qual a proposta, e o direito, inclusive, de participar da discussão de alternativas dessas propostas. Sempre têm alternativas que vão remover menos, o contrário do que está acontecendo no Brasil hoje.

Se há essa caixa preta sobre os impactos sobre a população, então há muito menos informações sobre os recursos que seriam destinados a essas comunidades, e a melhoria e ampliação dos equipamentos públicos que serão utilizados no local onde essas pessoas serão alocadas.
Tenho acompanhado todos esses projetos para a Copa e isso posso te dizer com muita segurança. Acompanho os protocolos que têm sido assinados entre o governo federal, os governos estaduais e prefeituras que envolvem a Copa do Mundo. Nenhum deixava claro qual será o destino da família. O meu grande temor é que a maior parte das famílias receba simplesmente o “cheque-despejo”. Joga na mão delas um cheque, às vezes, de R$ 5 mil, de R$ 3 mil, de R$ 8 mil, que todos nós sabemos que é absolutamente insuficiente para sequer comprar um barraco de favela.


Num processo sem discussão, essas famílias ficam sem escolha. É o que aconteceu na Copa da África do Sul, não?

É inadmissível que no Brasil, considerando a importância dos movimentos sociais por moradia, da luta pela terra, mesmo assim, nós vamos repetir aqui o que, por exemplo, acabamos de testemunhar na Índia, em Nova Deli, as consequências das reformas urbanas causadas pelo Commonwealth Games [que ocorrerão entre os dias 3 e 14 de outubro]. No Cazaquistão, em decorrência dos Jogos Asiáticos de Inverno (2011), na África do Sul, por causa da Copa do Mundo, especialmente na Cidade do Cabo, e na China, devido aos Jogos Olímpicos de Pequim, de 2008, ocorreram desrespeitos semelhantes em relação à moradia.

O que aconteceu?
É muito difícil ter os números exatos para dizer exatamente quantos foram os atingidos. Se fala num número de um milhão de pessoas removidas em função, não apenas das estruturas dos Jogos Olímpicos de 2008, mas também por causa de toda a transformação urbanística da cidade. Normalmente, na política chinesa, as famílias são removidas para conjuntos habitacionais na extrema periferia da cidade.

Mas a situação chinesa é melhor do que essa que testemunhamos em Nova Deli, por causa do Commonwealth Games, onde favelas foram inteiramente removidas e simplesmente não houve nenhuma alternativa de reassentamento para milhares de famílias.

No Cazaquistão, onde eu acabei de estar agora, para construir os estádios que serão utilizados pelo Jogos Asiáticos de Inverno, muitas famílias que viviam em assentamentos informais e que foram removidas receberam uma compensação financeira, mas essa compensação foi completamente insuficiente para elas poderem adquirir uma moradia digna com esses recursos. Estou falando de duzentas, trezentas famílias.

No caso da África do Sul, a localidade que eu acompanhei mais foi a Cidade do Cabo, onde existia uma favela enorme, com 20 mil moradores. O governo já havia, há muitos anos, anunciado a intenção de urbanizar essa favela. E o que acabou acontecendo é que pessoas que foram removidas para habitações temporárias – para que ficassem nessa condição provisória até a reurbanização e redesenho do assentamento – até hoje permanecem nessa condição provisória. Muitos residem em “casas” que apelidadas “microondas”, porque são contêineres feitos de metal. Os prédios novos nesse assentamento acabaram não indo para a população que morava lá antes, mas sim para uma população de maior renda.

Tudo isso são exemplos de como a questão da moradia tem sido tratada em decorrência de grandes eventos. E é tudo o que se prenuncia no Brasil se rapidamente não houver uma mobilização dos próprios assentados e de todas as redes de movimentos sociais para induzir a realização de uma política de direito à moradia.

O Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) é a instituição que, em teoria, deveria fomentar o desenvolvimento social do país. Afinal de contas, não seria a grande oportunidade dele exercer sua função social em relação a essa questão da moradia?
Essa questão do BNDES é ainda mais grave do que o modo como você está colocando. O governo brasileiro assumiu a posição de que o dinheiro público seria utilizado para obras de infraestrutura e mobilidade. Em relação aos estádios, seria pegar empréstimos de um banco público para investir nos estádios e, ao investir nos estádios, depois pagar de volta ao banco. Ele estaria atuando exatamente como ele atua hoje em vários ramos empresariais. Isso já acontece. Entretanto, está entrando dinheiro público sim, de uma maneira completamente indireta, mas eu vou citar alguns exemplos.

É o caso do estádio do Atlético Paranaense, em Curitiba. O Atlético, um clube privado, que teoricamente iria fazer a reforma de seu estádio, falando que iria se endividar, não iria pegar dinheiro do BNDES de acordo com que a FIFA pedia. Tem esse detalhe. A Fifa é a entidade mais corrupta de que se tem notícia. Ela consegue ser mais corrupta do que os governos. A Fifa exige reformas muito além do necessário, porque isso gera caixinha para seus dirigentes.
Tantos os projetos de reforma da Arena da Baixada, do Atlético Paranaense, e do estádio do Morumbi, do São Paulo, são semelhantes. Os dois clubes fizeram a proposta de reforma, que ia custar menos do que a Fifa queria, entre R$ 200 e R$ 300 milhões. A Fifa virou e falou que não, que não podia ser essa reforminha, teria que ser uma reforma maior, que gastasse algo em torno de R$ 500 milhões. No caso da Arena da Baixada, eles trabalham com o potencial construtivo do terreno [títulos imobiliários disponibilizados pela prefeitura de Curitiba e pelo estado do Paraná para promover a participação de investidores privados. A construtora que será contratada pelo Atlético Paranaense terá esses títulos como fiança. O valor máximo do potencial a ser cedido ao clube é R$ 90 milhões] onde está a arena, de modo que o investidor que está ali possa vender esse potencial construtivo, algo completamente delirante do ponto de vista jurídico.

Raquel Rolnik é urbanista, professora da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo (FAU-USP) e relatora especial da Organização das Nações Unidas (ONU) para o direito à moradia adequada

sábado, 25 de dezembro de 2010

Moradores protestam contra remoção



Apitos, cartazes e tambores deram o tom da manifestação de comunidades que moram no entorno dos trilhos da Via Expressa. Na tarde deste sábado, eles fizeram uma caminhada para pedir a adesão de mais moradores da região ao protesto contra a remoção das famílias que vivem ali, por causa de duas obras que fazem parte do eixo de mobilidade urbana para a Copa de 2014. Uma é a duplicação da Via Expressa e a outra é o Ramal Veículo Leve sobre Trilho (VLT) Parangaba/Mucuripe, que vai ligar a região hoteleira ao Centro e à Parangaba.

De acordo com a advogada Aline Furtado, da Organização Resistência Libertária, que tem oferecido apoio às comunidades, essas duas obras atingem os moradores da região, inclusive os mais antigos, que têm sofrido pressão psicológica muito forte. “Empresas terceirizadas já entraram nas casas das pessoas, tiraram fotos do local e isso tem causado pânico entre os moradores”, reclama. Para ela, o fato de o Governo não ter apresentado nem discutido o projeto com os moradores é um agravante, já que tudo o que eles sabem é por meio do que tem sido veiculado na imprensa.
 Fonte: O povo online 16/10/2010
A professora Nete Gomes da Silva, 41, mora há 20 anos na região e lembra que há pouco mais de dez anos, quando construíram a Via Expressa, sua casa foi desapropriada. Ela teve de passar de um lado da via para o outro. “A gente foi indenizado. Mas o dinheiro foi pouco e eu fiz a casa em cima da casa da minha sogra. O dinheiro não deu pra comprar uma casa legalizada (com escritura)”, afirma. Agora, com as obras previstas, ela teme passar pela mesma situação de novo, já que a sogra também não tem a escritura da casa. “A gente tem muito medo”, afirma.

Segundo Aline, oito comunidades já estão mobilizadas no movimento. “No momento, a pauta do movimento é a permanência da população, enquanto não for apresentado outro projeto, com estudos e propostas de moradia digna”, explica.

Conforme ela explica, muitas pessoas não têm a escritura das casas e, por isso, a indenização a ser paga seria apenas o equivalente às benfeitorias feitas pelos moradores, o que não daria condição de comprar uma nova casa.

Em Fortaleza, Comunidade do Trilho realiza ato contra remoção

Em Fortaleza, Comunidade do Trilho realiza ato contra remoção

Enquanto muitos fortalezenses já começaram a contagem regressiva para a Copa de 2014, outros estão preocupados com toda a mudança que ela pode gerar. É o caso dos moradores da Comunidade do Trilho, localizada na rua Marechal Rondon em Fortaleza, que temendo terem suas casa demolidas, realizarão domingo (18) uma manifestação para mostrar as diversas atividades que existem na comunidade como o balé, Muay Tay, Projeto Parque do Cocó, Batucada Bate Lata, quadrilha junina, entre outras.

Segundo informa a Comunidade, o motivo da remoção das famílias seria a possível instalação do Veículo Leve sobre Trilhos (VLT), um projeto que pretende levar os turistas do porto do Mucuripe para o Castelão durante a Copa no Brasil.

De acordo com Maria da Paz, moradora da comunidade, por várias vezes, os moradores tentaram marcar audiências tanto com a Prefeitura como com os órgãos competentes, mas os pedidos foram negados. "A única coisa que nós queremos é saber se isso é verdade ou não, por que precisamos nos preparar", diz a moradora.

O que Maria da Paz defende é que, após tantos anos, a Comunidade do Trilho já tem vida própria. Lá, as pessoas têm acesso à escolas, hospitais, Centro Comunitário. Caso essas famílias forem mesmo removidas, isso trará um grande prejuízo, pois já existem casos de moradores que ficaram doentes ao serem afastados de seus familiares e amigos.

Uma vez construída uma vida coletiva, se faz necessário que estes tipos de projetos que impactam no cotidiano da Comunidade sejam devidamente consultados.

"Aqui na comunidade existem muitos idosos, pessoas que nasceram, cresceram e construíram famílias aqui. Se eles tiverem que sair da comunidade, podem até não resistir", afirma.

A preocupação dos moradores se acentuou por conta de uma notícia veiculada em jornal local que citava o projeto VLT previsto para acontecer dentro das ações de estruturação para a Copa do Mundo em 2014. Os moradores chegaram a procurar a Prefeitura Municipal, que afirmou não possuir nenhum projeto deste tipo.

A atividade que realizam no próximo domingo é uma forma de obter respostas concretas sobre o assunto.

Fonte: Adital

Manifestação na Comunidade Trilha do Senhor

18 de julho, a partir das 9 horas da manhã na comunidade Trilha do Senhor entre as Av: Padre Antonio Tomás e Santos Dumont, especificamente na Rua Marechal Rondon, na Praça da Capela Nossa Senhora das Graças uma manhã com atividades culturais contra as remoções e desalojos.
Após o fim da copa da África, os grandes iniciam seus "super-projetos" para Fortaleza. Muitos processos de higienizações serão mascarados com obras. Sabemos da importância do evento para gerar emprego e renda para a capital, porém, as mudanças urbanas que a cidade deve sofrer deixa os moradores das comunidades do trilho, extremamente preocupados com mais uma remoção que, se ocorrer, deve prejudicar a vida de milhares de famílias: a instalação do VLT ( veículo leve sobre trilhos) que pretende levar os turistas do porto do Mucuripe para o Castelão durante a Copa 2014. Para fazer um alerta e sensibilizar a sociedade sobre esta questão, as comunidades farão uma manifestação hoje, 18 de julho contra a intervenção higienizante, que o Governo do Estado(CID) e Prefeitura(Luizianne) de Fortaleza querem realizar sem nenhum respeito à história e à memória destas comunidades, que tanto lutaram na construção de uma vida em sacrifício.
Chegou à vez de mostrarmos ao poder publico que estamos organizados e não queremos sair de nossas casas, que queremos melhorias como saneamento básico, lazer, educação e melhores condições de vida, tudo no próprio bairro, na própria comunidade. Pretendemos mostrar ao povo de Fortaleza e aos moradores da própria comunidade o quanto ela é boa e, que em caso de remoção, dificilmente terão acesso a essa interação e à segurança em outros bairros. Haverá apresentação das atividades culturais desenvolvidas pela comunidade como: ballet, Muay Tay, Projeto Parque do Cocó, Batucada Bate Lata e quadrilha junina.
As Comunidades do Trilho estão sempre sendo vítima de uma política urbana sem preocupação com o social. Ainda na década de 90, aproximadamente três mil famílias foram removidas sob a argumentação de construir a Via Expressa. Dessa vez o motivo é o VLT que, caso seja construído, não viabilizará que turistas conheçam o povo que construiu essa cidade com o suor da testa e os calos de suas mãos.